Daniel Campos

Prosas

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Encontrados 3193 textos. Exibindo página 308 de 320.

Mulher de branco

A mulher de branco não se revela. Pode ser enfermeira. Mãe de santo. Noiva. Médica. Dentista. Estudante de fisioterapia. Uma sobra de reveillon. Uma mulher de verão (leve). Uma mulher supersticiosa. Uma fase. Um ritual. Uma eventualidade. Uma roupa para malhar. Para namorar. Para ser vista. Para ser confundida. Para ser mistério. O mistério de reunir em si a junção de todas as cores. Mulher que tudo reflete e nada absorve, fazendo-se ausência.

Então, que venham as mulheres de branco. ...
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Mulher sentada à beira do caminho

Quem é a mulher sentada à beira do caminho. O que pensa a mulher sentada à beira do caminho. O que espera a mulher sentada à beira do caminho. Quantos os sonhos que se sentam ao seu lado. Quantos os passos que caem na rede de olhares da mulher sentada à beira do caminho. Quantos os que passam e deixam seu passar mudar de direção diante da mulher sentada à beira do caminho. Qual o tempo da mulher sentada à beira do caminho? Será o tempo dos incas, dos persas ou dos parnasianos? Quais os motivos que motivam a mulher sentada à beira do caminho? Quanto sexo é feito e desfeito nas cinzas da mulher sentada à beira do caminho. Quanto de deus há na mulher sentada à beira do caminho? Quantas as saudades em busca de caminhos que sentam no colo da mulher sentada a beira do caminho. Quanto de amor e quanto de guerra há na mulher sentada à beira do caminho. Quantos dias entardeceram e anoiteceram e amanheceram nos lábios da mulher sentada à beira do caminho. Quanto de luz há na sombra da mulher sentada à beira do caminho. Quantas flores e quantas pedras no sentar da mulher sentada à beira do caminho. Quanto de silêncio se silencia e quanto do silêncio se revolta e grita e canta e suspira na mulher sentada a beira do caminho? Quantos apóstolos tentaram e desistiram de seguir a mulher sentada à beira do caminho. Quem está por trás da mulher sentada a beira do caminho. Qual o caminho da mulher sentada à beira do caminho. Será de copas ou de ouro o blefe da mulher. Qual o vento que pousa na mulher sentada à beira do caminho. Quantos trevos têm a folha da sorte dos olhos da mulher sentada à beira do caminho. Quanto de mar ainda há nos pés de areia da mulher sentada à beira do caminho. Quantos se enforcam diante da mulher sentada à beira do caminho. Quanto de si já se perdeu na mulher sentada à beira do caminho. Quanto do perfume já se impregnou no cheiro da mulher sentada à beira do caminho. Quantas as cores que já se descoloriram no camaleão que habita a mulher sentada a beira do caminho.


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Mulher, chuva e café

Chovia. Mais um desses fins de tarde em que não se sabe se a cor do céu é negra por causa do prenúncio da noite ou por causa da chuva. As nuvens grossas impediam a lua de decifrar a charada. Tirante às dúvidas, chovia. Não aquela chuva de pancadas fortes que, de tão fortes, só acontece de repente. Chuva esta que precisava tomar fôlego para chover e, entre essas pausas, fazia com que sombrinhas se abrissem e tão logo se fechassem com ares de coreografia.

Mas, desta vez, era uma chuva leve que, de tão leve, fazia-se constante. Chuva que sufocava a poeira e deliciava a terra. Enquanto chovia esquentavam água nas chaleiras para o café. Chuva e café, um casamento feliz. E o cheiro do café misturado ao cheiro da chuva saía pelos ventos. Ventos que, como a chuva, caiam leves. O vento trazia o perfume da chuva e ganhava o perfume do café. Talvez, depois que se findasse a chuva, os aromas seriam outros. Não era para menos, a primavera estava a caminho. Mas isso ficaria para depois, por enquanto chovia....
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N'água

Os sonhos de Antonio deram n`água. O casamento de Tereza se perdeu na água. As economias de seu João afundaram n`água. A boneca de Rafaela foi brincar em outras águas. O orgulho de César caiu por água. O bolo de laranja de dona Carmela foi engolido pela água. A canção de seu Oscar desafinou n`água. O vestido de Laura foi levado pela água. A pinga de Atílio virou água. As lágrimas de Mariazinha salgaram a água.

Os latidos de Valente se calaram n`água. Os chinelos de Abigail correram pela água. O desespero de Nelson se misturou n`água. O medo de Clarice cresceu n`água. As histórias de seu Pedro desfolharam n`água. Os peixinhos de Aninha nadaram em outras águas. Os sapatos de Antenor sapatearam n`água. O televisor de Olga só exibiu água. O caldo do feijão ficou só água. O jardim ficou abaixo d`água. O flerte de Leonor acabou em m`água....
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Não acabou

Ando pelas ruas com passos lentos. Embora queira correr, movo-me como se fosse uma animação de um filme. Um filme que só conseguia ser exibido em câmera lenta. Quadro a quadro. Quero fugir de algo que não sei o que é. Todos fugimos de alguma coisa, não importa do que. O que interessa é que fugimos. E nesse momento eu ainda não sei do que fujo.

O céu está cinza. Talvez da poluição ou talvez de nuvens de chuva ou talvez porque deus resolveu acordar de mau-humor, sem nenhuma dose inspiração. Eu estou ansioso. Não consigo me deter em detalhes. O céu não é detalhe, mas... Ando e ando e ando e estou sempre no mesmo lugar....
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Não dá mais para segurar

Ele tinha tudo para se calar. Ele tinha tudo para não dar certo. Ele tinha tudo para ser mais um. Entretanto, venceu. Venceu e ultrapassou os limites da vida. Aliás, foi maior que ela. Tudo começou em 1945, no morro de São Carlos, Estácio de Sá. Nem é preciso dizer que estamos no Rio de Janeiro. Tempos de Getúlio Vargas. A única lembrança da mãe era uma foto amarelada e o medo de morrer tuberculoso como ela. Do pai, conhecia solidão, o abandono, a pobreza do carinho e o nome na certidão de nascimento. Cresceu com dois pais de criação. O menino foi tomando o universo da favela para dentro de si. Menino que soltava pipa e, carregava sacolas nas feiras e, no carnaval, escapulia para a avenida. A música lhe chegara com a forma de samba....
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Não deu tempo

Nuvens grávidas de escuridão. Entre lagos, a esperança vestia as arquibancadas e se misturava à torcida pela chuva. Intimidado, o vento soprava calado diante do ronco dos motores. Eram graves e agudos invadindo os ouvidos. As capas de chuva eram colocadas e tiradas como o ritual de uma dança indígena. O céu de enchia das ameaças de relâmpagos. Mas, por alguma maldição, o deus da chuva foi aprisionado. A previsão dos meteorologistas e as ameaças dos céus estavam demorando demais para vingar. Os olhos nus pediam a ajuda de binóculos para ver se enxergavam algum vestígio de nuvem molhada perdido no horizonte. Rezava-se. Implorava-se. Angustiava-se. Faltavam onze voltas quando ele entrou na reta dos boxes com o pé embaixo. Os olhos de caçador gritaram por aquele ataque cego à curva. De repente, um trovão seco ecoa pelos céus. Uma saída de traseira faz com que todo o azul do FW 116 ficasse de costas para meus olhos nublados. Ayrton Senna não conseguiu esperar pela chuva.


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Nem mais nem menos

Sem quaisquer cumprimentos, ela vem, como vinha todos os dias, e senta-se na mesa de sempre. Nem perto da porta, nem perto dos pratos quentes, nem perto da parede, nem perto do banheiro, nem perto do balcão de frios, nem perto do garçom, nem perto da cozinha. Em seus traços, um quê de uma Itália abrasileirada. Em seu prato raso, um pouco de alface e cenoura. Como se tivesse um combinado com o garçom, ao sentar-se um refrigerante, que tentava imitar o gosto de uva, já estava borbulhando em seu copo. Emburrada, come da forma mais lenta possível. Parece não ter mais nada para fazer em seu horário de almoço senão mastigar os ponteiros do relógio. ...
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Nenhum motivo explica a guerra

Como protagonista de mais uma tragédia cotidiana, Evandro João da Silva gritou por socorro e recebeu um tiro na barriga. Caído no centro da mesma cidade que receberá um dos maiores símbolos da paz entre os povos – as Olimpíadas, Evandro sentiu na carne o destino de muitos jovens. Perdeu o tênis, a jaqueta, a carteira... Perdeu a vida. Gritou por socorro, mas foi silenciado. Silenciado pela violência que buscou combater na coordenação social do Afroreggae, que tem um dos trabalhos sociais mais bonitos desenvolvidos neste País que grita por socorro assim como gritou Evandro. Grita contra a fome, contra a insegurança, contra o descaso. ...
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Novo Gênesis

Quem não acreditou no amor, no sorriso e na flor desconhece o sabor de um sonho. Sonho sonhado por tantos e de maneiras tão distintas, mas embalados por uma bossa. Quem nunca ouviu um disco de bossa-nova para sonhar um grande amor? Um cantinho, um violão e um pôr-do-sol. Não precisa mais nada. Se quiser, opte por uma noite de lua cheia, algumas estrelas num copo, uma predisposição para amar e pronto, o amor nasce de forma espontânea. Amadas e mais amadas.

Quantos não perderam seus olharem num mar longínquo, navegando num barquinho, imaginando a mulher amada nas ondas azuis e macias. Quantos os que justificavam um amor impossível pelo simples fato de ser primavera. De fato, amar parecia tão simples. É só olhar, depois sorrir, depois gostar. Talvez o amor fosse como aquela batida, tão complexa cheia de acordes dissonantes de variações impossíveis para as mãos de um amador e tão sutil e tão simples e tão próxima. ...
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