Daniel Campos

Prosas

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Encontrados 3193 textos. Exibindo página 314 de 320.

18/11/2011 - Viés e revés

Quando eu era nada, mais que nada, você era meu tudo, meu mundo, meu desejo mais profundo de amor. Tempos atrás, tarde lilás, axés e oxalás, eu já a tinha daqui, em sonhos que sonham longe demais. Nossa história apagou quase por completo a minha memória. Uma amnésia que só deixa eu me lembrar de você. Já não sei quantos anos se passaram, quantos caminhos começaram e acabaram diante dos meus pés. Só me recordo das nossas mãos, das nossas bocas, das nossas pernas dadas ao longo dessa andança que marcha rumo a nossa velha infância. ...
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Vila das valsas (trecho I)

"Dançava descalça pela grama enquanto estendia algumas peças de roupa. Inventava coreografias com os tecidos antes de pendurá-los no varal. Um balé entre roupas vermelhas, azuis, verdes e lençóis brancos. Um balé sem sapatilhas. Como num efeito óptico, ora eu via todas as linhas de seu corpo num desenho mágico ora eu via somente uma sombra escondida atrás de algum lençol. Não seria demais se ela se equilibrasse no arame do varal com a ponta dos pés, sem sombrinha, sem rede, sem público... e rodopiasse sem tocar os pés no chão"...
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Vila das valsas (trecho II)

"Sem adeuses, propriamente ditos, e em silêncio. É assim que eu parto, como fora assim em todas as outras vezes. Não podia impedir esse caminho que se traçava dentro de mim. Vontade de ficar e de ir embora ao mesmo tempo. Portanto, não podia dar ouvidos às minhas vontades. Apenas, fazia o que era para ser feito. Certo ou errado, tinha de ser feito. Pouco a pouco, os pés ganhavam ritmo. Eu e a estrada, velhos companheiros. Se gostamos um do outro, não sabíamos, mas guardamos certa intimidade. Eu não fugia dela, tampouco ela fugia de mim. Quando um de nós, independentemente de quem fosse, procurar pelo outro, saberia aonde encontrar".


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Vila das valsas (trecho III)

"Um casebre de madeira com uma longa varanda sustentada por velhos mourões. Talvez eucaliptos. Desci sem companhias. O trem, sem estímulos, cumpria o seu curso e aos apitos, alimentava-se de trilhos. Eu, sozinho, um lugar onde jamais pusera os pés antes. Fiz, mas o porquê de fazê-lo ainda não sabia. O estranho é que quando o trem parou, algo me dizia que aquela era a minha estação. Sem ninguém para pedir conselhos, tinha que escutar vozes que vinham não sei de onde. Hipóteses à parte, o fato é que eu estava na Estação de Vila das Valas. Uma placa trincada, talvez por prego, talvez por caruncho, talvez por idade, dependurava-se tímida num dos caibros da varanda. Vila das Valsas. Por enquanto, simples dizeres. Vila das Valsas. Uma cidade perdida entre o horizonte nublado e a terra úmida".


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21/10/2008 - Vinte e quatro anos de silêncio

O coração de Eloá ficou em silêncio. Mas não foi o silêncio eterno, tampouco o quase silêncio do coma. Foram 24 anos do mais puro silêncio. Com Eloá, ele viveu durante quinze anos. Poucas vezes deve ter pulsado tão rápido quanto nos dias em que ficou à mercê do ex-namorado e atual assassino. Diante das ameaças, um pulso desafinado. Diante do choro da mãe, um pulso sufocado. Diante do ataque da polícia, um pulso desesperado. Diante da solidariedade da amiga, um pulso consolador. Diante dos tiros, um pulso saudoso....
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19/12/2015 - Viola afiada

No riscado da viola eu te chamo e mostro num piscar de hora como um homem chora. Amor de viola não é amor de esmola, precisa de mais, sempre mais, para não se perder indo embora. Moda de viola é igual toada de coração que não se aprende na escola. No ponteio da viola serpenteio pelo mundão dos seus olhos e boio na imensidão da lua cheia que clareia nossos campos. Nas cordas da viola eu amarro uma paixão, enforco qualquer dor e ainda quebro quebranto. Na viola eu mareio e incendeio qual fogueira de São João. A viola é como cola nos meus dedos, quando prende não solta mais não e aí meu corpo se rende a mais um refrão. Na viola, a gente se embola, se enrola e decola como fagulha do carvão. Nota a nota, a viola amola o nosso destino numa pedra chamada coração.


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21/02/2016 - Viola atrevida

Toca viola porque viola é de tocar rezando. E agora é preciso muita reza porque o dia já vai se acabando. É preciso reza para boiada não se perder. É preciso reza para o coração não escurecer. As sombras estão por aí e tem gente que tomba aqui e ali pelo que assombra do cachorro ao bem-te-vi, do lobo ao quati, do branco ao tupi. Toca viola porque viola é a moda do deus, do deus caipira que não se convenceu de que precisaria estar num altar para que pelos seus dias seus pés viessem beijar. O deus da viola é o deus dos carreiros, dos violeiros, dos boiadeiros que mais do que boi tocam o que ainda não foi. No canto da viola o estradão se alumia e o boi que fugia volta sem revolta. O vento dá reviravolta pra mor de seguir com a viola que se enche de lua e flutua no terreiro do pequizeiro que dá moda e dá pequi o ano inteiro. Toca viola porque viola é reza das brabas, que enche de lua e de sol a estrada da moçada que acorda para a lida, que reacorda para vida, toda vez que as cordas da viola dão aquela tremida. Êta viola atrevida! ...
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18/03/2016 - Violão arredio

O violão está num canto esquecido, perdido em canções silenciosas. Só escapa uma ou outra nota quando o vento vibra as cordas que mais parecem cobras espichadas ao sol, sem intenção de bote. Inofensiva e decorativa, assim vai aquela peça de madeira entalhada para cantar. O meu violão caipira, do interior do interior, se avexa com a cidade grande e tem saudade do mato. Queria ter sido violão pantaneiro, mas acabou num canto do quarto de um desafinado. Pobre violão que não é tocado, que não é abraçado, que não é incorporado ao corpo do seu mestre. Talvez fosse melhor entregá-lo à correnteza para ele escolher o seu dono rio abaixo. Suas seis cordas não conversam entre si. Suas casas vão ficando cada vez mais longe uma das outras. Suas curvas vão pegando poeira e o silêncio lhe dá uma canseira. Parece que chora um choro quieto, de inutilidade, de frustração, de descriação. Por essas e outras, maltratado naquilo que nasceu para ser, mais dia menos dia ele irá num pé de vento ou nas mãos de uma mulher que ao contrário do meu coração prefira fugir com meu violão.


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24/10/2015 - Vira a página

Vira o disco, muda a música, troca de olhar, do jeito de olhar. Saia da mesmice, deixa de crendice, troca de fetiche... Pra que tanta tolice? Vá para outra página, viva outra história, invente outro final... Nem tudo é bem nem tudo é mal. Permita-se o novo. Peça outro prato, visite outro canal, estabeleça novos contatos de primeiro, segundo, terceiro grau. Repagine-se por dentro e por fora. Manda o habitual embora. Se ri, chora. Se chora, ri. Vá pra lá se está aqui. Vem pra cá se está ali. Deixa de medo do desconhecido, do diferente, do tempo ainda não nascido. Jogue-se à mudança. Cultive a esperança. Alcança o que está para além do seu teto e do seu fundo. Rompa a casca. O que é seu ninguém tasca. Vá ao profundo do seu ser para se encontrar e para se esquecer. Para nascer é preciso morrer. ...
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19/05/2015 - Vira homem vira bicho

O sapo se incha todo e até toma banho no lodo querendo namorar. O pavão abre a cauda, a cigarra estronda, o cachorro uiva querendo namorar. O gato mostra as unhas, a galinha abre as asas e o rato sai da toca querendo namorar. O canguru troca de bolsa, o jacaré palita os dentes e a girafa estica ainda mais o pescoço querendo namorar. O galo estufa o peito, o macaco faz graça e a cobra encontra seus pés querendo namorar. O porco rola na lama, a mula pisa feito uma dama e a lagartixa cai na cama querendo namorar. O grilo afina a sanfona, o tatu fica nu e a maritaca se ataca querendo namorar. O pato até bota ovo, o carrapato desgruda e a matilha fica muda querendo namorar. O leão penteia a juba, o cisne faz pose e o cavalo empina querendo namorar. A formiga sai da trilha, a hiena fica séria e o elefante é todo ouvido querendo namorar. A onça dá pinta, o lagarto dá língua e o papagaio dá o pé querendo namorar. O morcego dá com a cara na parede e o peixe cai na rede querendo namorar. O cupim morde, o bode cospe, o hipopótamo se sacode querendo namorar. A vaca se esfrega, o coelho não sossega, a cabra fica cega querendo namorar. O tubarão se faz de vilão, o pinguim jura fidelidade e a aranha teia a saudade querendo namorar. O jumento dá coice, o camaleão muda de cor e a taturana pega fogo querendo namorar. O homem vira bicho e o bicho vira homem querendo namorar. ...
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